Hoje fui surpreendido com a notícia
de que o candidato à prefeitura de Macapá pelo PSOL - Clécio Luis - conseguiu
ir para o segundo turno por meio da coligação com partidos bastante
questionáveis. Possa parecer estranho, para quem sabe que sou militante do
PSOL, somente agora descobrir tal informação. A razão se deve por dois motivos:
minha filiação somente aconteceu em março deste ano, como também pelo fato de
não pautar minha militância nas eleições municipais, estaduais e federal, posto
que o cenário resultante desse processo é sempre desanimador.
A maior parte da
militância do PSOL rompeu com o PT
devido ao seu fisiologismo político na disputa eleitoral, às questionáveis
alianças com setores da direita que permitiram a eleição de Lula à presidência em
2002 e, principalmente, o vale-tudo na disputa pelo poder. Grosso modo, o que
define um partido de esquerda é a sua não ilusão nos mecanismos de poder da
sociedade capitalista. Obviamente, não significa ausentar-se do processo
eleitoral, mas participar dele para evidenciar as contradições mascaradas de
democracia, transmudadas em aparelhismo estéril da máquina capitalista.
Nesse sentido, a coligação que levou
Clécio ao segundo turno na capital do Estado do Amapá é um prenúncio do cuidado que o PSOL deve ter para não repetir a história e não se tornar igual ou pior
do que é o PT hoje. Coligado a partidos como o Partido Verde (PV), o Partido da Mobilização Nacional (PMN),
o Partido Trabalhista Cristão (PTC) e o Partido Renovador Trabalhista (PRTB),
no Macapá, o PSOL ameaça por em dúvida a confiança que o movimento LGBT tem depositado
nele - confiança resultada das significativas atuações de parlamentares do PSOL no Congresso Federal e
nas Assembléias Legislativas.
No que se refere à pauta LGBT, dois
problemas apresentam-se nessa coligação: o primeiro é o fato de esses partidos
terem parlamentares atuantes abertamente contra a garantia dessas pautas; o
segundo é o fato de, por serem apontados como partidos de aluguel, seus
candidatos são escolhidos por outros motivos que não um filtro ideológico.
Segundo material divulgado na
internet, orientando os eleitores LGBT, feito por Leandro Oliveira[1], o
PV já foi um bom partido pró-LGBT, mas as candidaturas de evangélicos
fundamentalistas como a do deputado federal Roberto de Lucena, torna aconselhável
o eleitor pensar duas vezes antes de votar nele. Esse deputado foi o relator
que deu parecer favorável ao projeto de lei feito pelo Deputado Federal do PSDB
João Campos, projeto que pretende legalizar a "cura" de homossexuais,
além de cinco deputados federais desse partido terem assinados essa PEC . Vale lembrar que, em 2010, Marina Silva, candidata à presidencia por esse partido manifestou-se contrária a aprovação do casamento civil e, num surto de democratismo, afirmou que, caso eleita, faria um plebiscito sobre o tema, esquecendo que Direitos Humanos não se negociam.
O PMN também não é indicado como um
bom partido para a população LGBT por dois motivos: primeiro porque faz parte
dele a única deputada federal Jaqueline Roriz, acusada de, junto com o marido,
receber um maço de dinheiro das mãos de Durval Barbosa, delator do Mensalão do
DEM, após notícia divulgada pelo jornal Estado de São Paulo em 4 de março de
2011[2];
o segundo motivo deve-se ao fato de um vereador desse partido no Rio de Janeiro votou a favor da lei de Carlos
Bolsonaro pela proibição de materiais sobre diversidade sexual nas escolas do
município[3].
Também o PRTB, partido de Levi
Fidelix, está entre os não indicados. Em agosto de 2010, o site casamento civil
igualitário publicou o posicionamento dos presidenciáveis sobre o casamento
civil entre pessoas do mesmo sexo, questionados em uma sabatina pelo R7[4].
Levi Fidélix, fundador do PRTB, manifestou-se contrário ao casamento,
mostrou-se preconceituoso e desinformado, associando a homossexualidade à
doença, desvio e pecado.
Ainda considerando o levantamento
feito por Oliveira, o PTC foi o partido que elegeu
Clodovil Hernandes em 2006 para Deputado Federal, cuja atuação, além de
elitista e misógina, o fez aliar-se em vários momentos com deputados
homofóbicos, bem como manifestar-se contra os direitos LGBT. Embora gay
assumido, Clodovil era de uma consciência política retrógrada e moralista,
prejudicando significativamente as bandeiras contra a homofobia e pelos
direitos LGBT.
Com sua morte em 2009, foi
substituído pelo Coronel da Polícia Militar de São Paulo Jairo de Paes Lira, também
do PTC, conhecido pelos seus constantes ataques aos direitos da população LGBT.
Só para citar um caso, em 2010, esse deputado criticou a decisão do STJ por ter
garantido o direito à adoção para um casal de lésbicas. Vale dizer que esse
deputado tem veementemente atacado a descriminalização do aborto, pauta tão
cara para o movimento feminista e que também é pauta reivindicada pelo
movimento LGBT[5].
Outro problema nessa coligação é o
fato de alguns desses partidos serem conhecidos como partidos de aluguel, isto
é, usado por um partido mais forte com finalidade estratégica, como por exemplo,
ampliar o tempo de televisão; utilizar esse tempo apenas para atacar opositores
ao partido indiretamente ligado; compor coligação para ampliar o número de
candidatos, entre outras funções. O mais perigoso nesses partidos é que, servindo
ao vale-tudo eleitoral, tornam-se espaços para "celebridades" sem
compromisso com a coisa pública, os quais elegem-se não por uma boa
candidatura, mas pela fama que gozam entre seus fãs. É o caso da "cantora"
Lauriete - celebridade versão gospel - do PSC, cuja atuação no Congresso afronta o Estado Laico, além de militar contra os direitos humanos da população LGBT.
Embora o PPS seja um partido
pró-LGBT e estatutariamente socialista, na prática tem compactuado com o que há
de mais reacionário na política brasileira. Em São Paulo, Soninha, candidata a prefeitura
por esse partido, fez parte da gestão Kassab, cuja principal política foi de
higienização com fins de favorecer a especulação imobiliária no vergonhoso
ataque aos moradores de rua na região do Centro conhecido como Cracolândia.
Também apoiou a candidatura de Geraldo Alckmin para Governador de São
Paulo e que, logo depois de eleito, foi responsável pelo massacre do Pinheirinho.
Diante dessas informações
apresentadas, pergunto ao PSOL de Macapá: o vale-tudo eleitoral será aceito
em detrimento dos direitos humanos fundamentais da população LGBT? Caso o
Clécio ganhe a prefeitura, estará disposto a abrir mão de princípios estatutários
do PSOL por conta da aliança com esses partidos? Porque certamente ele será
cobrado por esses fisiologistas que têm causado muito mal às políticas públicas
e violado a Constituição Federal.
Minha filiação ao PSOL não significa
voto de silêncio, principalmente diante de absurdos como esse. Por uma questão de compromisso
político que tenho com a bandeira LGBT e com a luta pelos Direitos Humanos é
que faço publicamente essa cobrança ao companheiro Clécio Luis e ao PSOL de
Macapá.
Não sou militante do PSOL no
movimento LGBT, pelo contrário, sou militante LGBT no Partido Socialista e
Liberdade. Podem até argumentar haver questões específicas locais que tenham motivado
essa coligação, mas é preciso entender a política em sua totalidade. Alguns
podem alegar certo puritanismo, mas não se trata disso. Trata-se de entender
que a pauta LGBT, a pauta feminista, do movimento negro, do movimento indígena, a
concepção de economia, de segurança pública, de saúde, de educação, de moradia,
estão em diálogos constantes e não podem ser interrompidos por partidos
fisiologistas, nem sufocadas pelo vale-tudo eleitoral. Do contrário, coligações como essa podem
tornar-se uma grande nuvem que apagará o sol e nos devolverá às trevas
políticas contra o que tanto lutamos.
[1]
http://www.eleicoeshoje.com.br/outros-partidos-que-nao-merecem-seu-voto/#axzz28x6aKKAf
[2]
essa informação evidencia que o trabalho de Leandro não está focado apenas na
pauta LGBT, mas sobretudo no compromisso com a ética na política brasileira.
[4]
http://casamentoigualitario.wordpress.com/
[5]
http://www.votopelavida.com/paesdelira.htm
Nenhum comentário:
Postar um comentário